quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Cotidianos

I.
O pai fazia a mamadeira pela manhã, alimento para seu único rebento. Ritual sagrado: leite, pitada de açúcar e o amor transbordante.

II.
Das poucas lembranças advindas da infância, sobraram apenas meros espasmos da memória: o calor das mãos, o morno e alvo fluido que escorria pela garganta preenchendo o vazio que carregava em si, nalguma região do corpo que, na época, desconhecia qual era. Além disso, a falta que lhe perseguiu a vida inteira.

III.
Um diário riso forçado durante a entrega do leite. O alívio por não ter um filho para criar. O amor pela mulher do outro. O gozo de todos os dias.

IV.
Ponte. Queda. Caos.

V.
Durante a noite de ontem, por volta das três horas da tarde, os motoristas da cidade e região enfrentaram um longo congestionamento que durou por algumas horas. Isso se deu devido à L.G.F., 30 anos, que sofreu uma queda de mais de vinte metros de um dos viadutos da zona central, vindo a falecer no local. De acordo com a polícia, a mulher e seu marido tinham um filho com cerca de dois anos de idade. Ao questionar a família  acerca do ocorrido, parentes próximos afirmaram que o casal vivia uma vida tranquila e feliz, embora nos últimos dias G.H.F., 41 anos e pai da criança, tenha recebido mensagens em seu aparelho telefônico questionando sua real paternidade. Os investigadores buscam saber se houve participação do homem na morte da esposa.