quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Realidade

Senti sua falta ontem a noite, Jaílson, quando saiu do bar sem falar nada. Foi como se um peso de realidade tivesse caído sobre mim. Ainda por cima aquelas pessoas me olhando dentro do bar, como se eu acabasse de cometer um crime. Acho que foi esse peso de realidade que me deu o insight de ontem. Senti minhas pupilas dilatando. Acredito que a realidade seja bem próxima da loucura, Jaílson. Olhe aqueles mendigos, ali na rua. Sujos, esfarrapados, eles percebem sua própria condição? E aquele ali... ele está conversando com quem Jaílson? Esse ser com quem ele conversa é real? Imaginário? E pra quem ele ocupa essa posição de real /imaginário? Pra mim? Pra você, Jaílson? Pra ele mesmo, esse mendigo?!

Já percebeu que os olhos desse homem são diferentes? Deve ter algo nos olhos dele que permita uma visão daquilo que ninguém pode ver. Os olhos dele não parecem com os olhos de um louco. Realidade? Que palavra pífia, não é mesmo, Jaílson? Não significa nada para o vocabulário dos loucos... nada para o vocabulário dos poetas... acho que já não significa nada nem para o meu vocabulário depois de ontem, aquele bando de gente podre me olhando, com suas pupilas acusadoras de quem se limita a acreditar em algo que sua mente produz. Não é contraditório isso, Jaílson? Eu aqui falando de realidade e questiono a crença alheia em coisas da mente... acredito que eu mesmo seja um pífio, meu caro... eu mesmo...

Deixe-me tomar um último gole. Acho que vou pra cama. Meus dedos estão formigando e minha cabeça meio bagunçada. Efeitos do peso de realidade! A noção de que se vive. Boa noite, meu caro amigo. Nos encontraremos novamente e muito em breve. Seja nesse bar, seja em outros lugares.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Conhaque

Felizes para sempre. É assim que deveriam terminar as histórias de amor, não é mesmo, Jaílson? Mas e aquele casal ali na outra mesa. Parecem felizes para você, amigo? Veja seus olhos, é como se carregassem neles todo o peso de uma morte a dois. Aos poucos esses enamorados se aleijam, pois tiram um do outro o que cada um tem de melhor pra si. Concentram suas forças para o bem individual alheio e, assim, bem devagar eles se cegam... cegam-se... e como consequência dessa bobagem se matam e matam-se. Feliz você, meu caro, que se esconde nos bares e mentes, Jaílson. Ainda não reconhece a carnificina cega do amor. É, bem que Drummond dizia que conhaque põe a gente comovida como o diabo.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

A primeira noite

E de todos os amigos que eu vi hoje, Jaílson, você era o que eu menos queria a presença. Pode parecer grosseiro de minha parte, confesso, mas é justamente a sua ausência que faz com que tudo seja diferente. Seu jeito calado de quem, de fato, sabe ouvir, Jaílson, intensifica o momento poético de um desabafo em que palavras são substituídas por sentimentos. 
É gostoso procurar por seus olhos e não os encontrar. Me faz bem, sabe?
Alguns desconfiam de sua índole, acho que por isso você se faz tão ausente as vezes. Mas eles não entendem que são elas, sua índole e sua ausência, que mexem comigo, que me fazem te procurar nos lugares mais obscuros: bares, cafeterias, pessoas, minha própria mente.  Sempre em um desses te encontro: cabeça baixa,  cigarro na boca,  copo de álcool já pela metade e em seus olhos um leve brilho causado pela ponta do cigarro aceso.
E esta noite, por outra vez percebo a sua ausência, meu caro amigo. Mas, devo dizer, fico feliz, pois novamente irei te procurar em todos esses lugares e sei que, sem dúvida, te encontrarei. Trocaremos algumas palavras. Eu, de novo, sei que falarei mais. Mas eu, acima de todos, saberei o peso da sua presença/ausência. Estou indo ao seu encontro.